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26 de março de 2013

NENA CABRAL COMENTA: PARA ESPECIALISTAS, POLÍTICOS PARA MULHERES PASSAM POR ‘RETROCESSO’

MINISTRA DISCORDA, DIZ QUE ELEIÇÃO DE DILMA TROUXE MAIS ‘CONFIANÇA’, MAS RECONHECE QUE AINDA É POSSÍVEL MELHORAR.

Pouco mais de dois anos depois do início do governo Dilma Rousseff, especialistas em Políticas Públicas para Mulheres dizem que a expectativa de uma grande mudança no setor foi frustrada. Alguns chegam a falar em "retrocesso", quando são analisadas questões como a saúde da mulher. Temas como mercado de trabalho, jornada dupla, aborto e até o Bolsa Família também preocupam. Titular da Secretaria de Políticas Públicas para Mulheres, a ministra Eleonora Menicucci discorda que haja um retrocesso e diz que, a partir da eleição de Dilma, "as mulheres se tornaram mais confiantes, mas que a mudança é lenta, já que séculos de patriarcado não mudam rápido". No entanto, reconhece que ainda é preciso melhorar em alguns setores como "atenção ao trabalho, climatério e menopausa e saúde mental".

- Dilma criou o Rede Cegonha, focado em gravidez e parto, que era uma característica no Brasil antes dos anos 80. Mas saúde da mulher é também menopausa, saúde mental, câncer, infertilidade, DST, aspectos que estão fora do guarda-chuva materno-infantil. Foi uma decepção. Esperávamos um plano integrado de saúde da mulher - diz Angela Freitas, socióloga e representante da Articulação de Mulheres Brasileiras no Cedim: - Mas o que nos surpreendeu foi uma restrição maior ao aborto. Há uma rejeição a qualquer diálogo sobre a descriminalização e os direitos reprodutivos. Dilma vem sendo fiel aos acordos que fez com a Igreja na campanha.
Coordenadora do Grupo Curumim, Paula Viana diz que o movimento feminista já vinha se decepcionando desde o governo Lula:

- A questão é que agora vemos com perplexidade um retrocesso. Claro que não há discordância de que deve haver investimentos em gravidez, parto, pós-parto e bebês. Mas existem outras questões. O câncer de mama continua quase descontrolado, o Estado não divulga muitas informações sobre planejamento familiar, não discutimos o aborto inseguro, sendo que temos por ano mais de um milhão de abortos clandestinos no país, e tudo isso aponta para falta de integralidade. Olhamos a mulher como reprodutora.
Segundo a ministra, o Rede Cegonha, que foi lançado em março de 2011, é uma das nove ações da política de ação integrada da saúde da mulher:
- Se pensarmos o programa isoladamente, ele é materno-infantil. Mas é uma das ações. E já fez diminuir bastante a morte materna e a gravidez na adolescência. É suficiente? Não. Temos que melhorar em relação à atenção ao trabalho, climatério e menopausa e saúde mental.
A ministra diz ainda que políticas como o Bolsa Família, Pronatec e Luz Para Todos têm contribuído para o avanço das mulheres.

- No Bolsa Família, 92% dos cartões estão nas mãos das mulheres. As mais pobres conseguiram mais autonomia. Antes, o pouco que tinham era dos homens. Com o Bolsa, já tivemos relatos de mulheres que dizem que agora podem se separar, que têm como se manter. Há quem fale que o Bolsa Família coloca a mulher dentro de casa, mas vemos que estão tendo a oportunidade de ir a público - defende Eleonora: - Além disso, o Luz Para Todos, que não é uma política criada para as mulheres, tem mostrado que cidade iluminada faz cair a violência. E no Pronatec, em 2011, as mulheres eram responsáveis por 66% das matrículas. O impactante é que estão em setores até então ocupados por homens, como construção civil e agropecuária.
Diretora do Centro Feminista de Estudos e Assessoria (Cfemea), Guacira Oliveira vê o Bolsa Família como uma ação importante, mas de caráter emergencial. Para ela, é preciso garantir o sustento das mulheres independente do Estado e do marido:
- Sem uma ação coordenada não tem como deixar de receber a bolsa. Sabemos que várias se livraram de ação de violência por conta desse dinheiro, que elas colocam o recurso no bem-estar da família, mas se não tem creche, por exemplo, como parar de receber? Ela não tem com quem deixar os filhos para trabalhar. As mulheres são vistas agora como parte da engrenagem de combate à pobreza, mas não são vistas como sujeito que demanda autonomia e igualdade de direitos.
Para Guacira, as políticas não respondem a demanda da mulher "dona da própria vida":
- Não tem muita discussão, por exemplo, sobre dupla jornada, sobre mulheres cuidando dos filhos e dos idosos. Sem isso é difícil ganhar autonomia econômica e melhores condições de vida. A questão é conduzida de forma conservadora.
Brasil: 9,6% de mulheres no parlamento
Na política, dezoito anos depois da 4ª Conferência Mundial sobre as Mulheres, em Pequim, quando foi estabelecido que 30% das vagas no Parlamento deveriam ser preenchidas por mulheres, a participação feminina ainda é muito baixa. De acordo com dados do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH)/2012, o Brasil, que ocupa a 85ª posição, tem apenas 9,6% de mulheres no Parlamento. A baixa representatividade é reconhecida pela ministra, que acredita que o "nó está na necessidade urgente de uma reforma eleitoral":

- Ter representatividade é um dos nossos maiores desafios, e não depende só de política de Estado. Depende da sociedade civil pressionar os partidos. Temos a lei, mas precisou uma mulher assumir o TSE (ministra Cármen Lúcia) para que em 2012 fosse cobrada. Daí, atingimos 31% de candidatas. É um avanço, mas é muito pouco. Agora, se não houver uma reforma política para igualar o financiamento de campanha, será difícil. A cultura dos partidos é distribuir recursos para os homens.
Um dos organizadores da pesquisa "Mulheres nas eleições 2010", José Eustáquio Diniz lembra que em 2012, quando o TSE exigiu que lei fosse cumprida, os partidos lançaram mão de laranjas:

- Pegaram mães, filhas, secretárias e elas foram concorrer sem nenhum apoio. É importante ter mulheres em cargos de decisão de poder, mas no Brasil não tem nenhum partido presidido por elas. O ideal é que haja paridade na política. Mas os partidos precisam mudar. O eleitorado já mostrou que vota em mulher. Em 2010, duas mulheres, Dilma e Marina (Silva), tiveram 2/3 dos votos.

Fonte: Jornal de Commercio

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